Ninguém pode gostar do que não gosta, forçando o gesto ou disfarçando a impaciência. Uma figura virtual é sempre amável e encontra facilmente quem a afague em gestos de ternura surpreendida. Na tragédia do dia a dia o doce movimento de darem a mão, o tempo e a atenção sincera, cativa o rosto e o momento, até que o devaneio e a força do sentir se sobreponham no avaliar da situação. É nesses intervalos que a figura virtual sobrevive e é deles que faz a sua dieta desequilibrada de sentimentos. Depois, mesmo esses ocasionais vestígios de afecto secam e a figura virtual fica à deriva, na carência irracional de um gesto que a faça ser. Entretanto, o objecto da sua atenção, permanece enredado em desejos de realidades ideais, relegando a figura virtual para os pontos baixos da travessia.
Não se é figura virtual por gosto ou por dever. É um local de passagem à espera de oportunidade melhor. Por vezes acredita-se que a mão que se dá é uma mão que se toma e que essa é a ocasião de sobreviver. Mas provavelmente nunca acontece. Há sempre o drama de temermos que as nossas vidas se percam por tão pouco e fique no ar todo o mundo que, por uma pequena razão, se rejeita. Há uma economia da figura virtual. Não se consegue amá-la mais do que um pedaço e isso não chega nem para quem a ama, nem para a figura que espera um afecto que a salve da sua virtualidade.
O que a figura virtual pede, na sua irracional ansiedade, é ser querida tal como é, sem precisar de uma mutação genética que a faça parecer tão real que não envergonhe ninguém nos lugares de esplendor eleito. Por que a figura virtual ficará sempre justamente intimidada pelo contraste do excesso e da grandeza.
Reconheço que há uma armadilha no sorriso doce da figura virtual. Quer mais do que pede; pede mais do que é capaz de ter; tem mais do que é capaz de desejar. Faz o que pode para ser escolhido mas não pode muito, porque soçobra em todas as comparações, e depois, no fim dos tempos, fica à espera de ser capaz de voltar a sair à rua e enfrentar o sol.