São os fantasmas que governam.
Vivem na escuridão, na sua nocturna providência, e mandam.
Regulam os gestos e os olhares, encaminham os desejos e dissimulam.
São os fantasmas que governam.
Dirigem os passos de maneira subtil.
Sorriem sobre o modo ausente de ser.
Empurram com elegância cada pensamento para o abismo.
Não deixam nada ao acaso, a não ser a aparência de que é o acaso que comanda.
E é o acaso que comanda, logo no nível acima.
Mas os fantasmas ficam contentes por sentirem que no nível em que se movem, e fazem mover toda a gente, são eles que determinam.
Ficam contentes no seu papel de senhores da vontade.
É curto o tempo da existência.
E inconsequente também.
Mais quente ou mais frio, para o planeta tanto faz.
Um homem e uma galinha apenas diferem no grau de destruição.
E na dimensão dos dejectos.
Para o planeta.
Sobre o planeta mandam os fantasmas.
Tiraram o poder aos deuses que primeiro inventaram para isso.
E condenam tudo o que lhes tenta sair debaixo da sola aveludada.
Marcam com um ferro em brasa o tresloucado.
Dão como exemplo o súbdito menor.
Estranha linhagem esta que não partilha o sangue mas o tilintar das moedas.
A montanha onde subo e em que cumpro a minha pena não tem ainda tributo.
Mas virá o dia em que, para o meu bem de condenado, será necessário que a minha pele se entregue para leilão.
São os fantasmas que governam.
Encostados uns aos outros, de liturgia em punho, defendem-me de mim.
Traçam do destino as linhas principais e ajudam-me a identificar o ouro e a lama.
Aquecem os meus neurónios para que se alegrem com a felicidade dos fantasmas.
Digo-lhes que a minha pena é antiga e sobreviveu a multidões como eles.
Depois deles virão outros.
E eu permanecerei aqui, feliz por não ter razão.
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