Vêm aí as férias e já estou cansado das férias que aí vêm.
Também estou cansado de estar à espera das férias.
Cansa-me pensar em férias quase tanto como estar de férias.
Faço férias das férias de que estou cansado.
Faço de conta que faço férias, descansando das férias que fiz enquanto o trabalho esperava sentado.
Assim faço render as férias para que durem até às próximas férias.
Quando vou de férias espero ficar de férias para sempre, isto é, não voltar das férias.
Porque o regresso das férias é um verdadeiro tormento.
Passo as férias todas aborrecido com a ideia de que as férias vão acabar.
E cansa muito pensar que as férias têm um fim.
Fico cansado a pensar que dali a uns dias, as férias, que ainda não comecei, já acabaram.
É terrível pensar nisso.
Mas é nisso que tenho pensado.
Que daqui a dias vou estar de férias, mas numas férias que mais dia menos dia acabam.
E pensar que mais tarde ou mais cedo as férias que um dias destes vão começar, acabam, dá-me uma angústia mortal e uma vontade enorme de que não seja verdade.
Suponho que é por este cansaço acumulado de estar a pensar que as férias que ainda não comecei vão acabar que estou mesmo a precisar de férias.
Mas as férias de que estou a precisar não são estas férias que vou ter mas outras que não fossem, como estas, tão angustiantes.
Precisava de umas férias em que desde o primeiro dia não estivesse preocupado por saber que as férias que eventualmente me vão saber tão bem, não podem ser assim tão boas porque vão, a dada altura ter um fim.
E não há nada mais angustiante que um fim de férias.
Os dias finais, quando poderíamos estar a ficar realmente adaptados ao sabor pleno dos dias de férias e em que, numa boa hipótese, já nem pensássemos que as férias têm um fim, são, afinal, os dias em que o fim já se aproxima a passos largos e coloca o peso insuportável do fim das férias em cima das nossas costas juntamente com a bagagem.
Mesmo que as férias sejam em casa.
Mesmo sem sair de casa a bagagem pesa.
Porque ficando em casa sem sair, para ter efectivamente férias, aumenta ainda mais a angústia do fim das férias.
Porque no fim das férias é necessário ter uma memória qualquer de férias que possa preencher aquele espaço quadrado onde ficam inscritas as férias como definição.
Não tendo essa memória, as férias ficam indescritíveis, no verdadeiro sentido do termo.
E sendo assim não é possível ficar tranquilamente à espera das férias se não se tem a expectativa de as férias serem num lugar descritível qualquer.
O dilema torna-se verdadeiramente voraz:
Ter férias pressupõe uma carga de trabalhos.
Não ter férias é assumir uma estranha personalidade anti-social.
Ficar em casa nas férias corresponde a aniquilar um ano inteiro de tranquilidade.
Estou muito cansado de pensar nas férias.
Aproximam-se como um monstro, uma tempestade tropical.
Se eu estivesse empregado pelo menos teria menos tempo para pensar nisto.
Torcato Matos
1 comentário:
A lucidez de descrever o drama da impossibilidade de viver, qualquer que seja a maneira...
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