Sabes que eu tenho que estar a uma certa distância das coisas para as saber olhar. Faço isso como ninguém, e não estou à espera de conseguir libertar-me deste peso e reconsiderar a direcção que os meus passos levam.
Também sabes que à distância a que percebo as coisas há apenas ecos e não ouço nada do que é som próprio do momento. Os gritos chegam já tarde à minha imaginação e eu não espero que eles tenham sentido. Não espero nada. Mesmo que não seja bem assim como me ocorre agora dizê-lo, porque há sempre estas palavras que não chegam, que não são suficientes para que me percebas.
Não, não tenho gestos bruscos. Não procuro na impaciência a razão que sei ter ficado escondida num quarto escuro da infância. O que sobra de cada momento não chega para ocultar esse vício que tenho de chamar verdade ao que vejo. E não oscilo. Não mudo o meu papaguear apenas para que possas por momentos ouvir o meu silêncio.
É certo que houve um tempo em que gostavas das minhas palavras. Eu tinha aberto o sótão das tristezas e a brisa nova parecia levantar a cabeça para o alto das transgressões e dos movimentos aleatórios. Vinha-me o riso, assim de repente, conflito de interesses entre o meu rosto fechado e a vontade de saltar com gritos de adolescente.
Preparei-me para quase tudo. Era esse o meu entretenimento favorito: ficar à espera de surpreender o acaso com uma mostra de conhecimento antecipado de tudo o que ele me pudesse trazer. Obsessão minha. Erro. Há demasiada diversidade na imaginação do tempo. Por mais seguro que estivesse vinha sempre uma vaga inesperada. E as ocasiões de voar eram poucas. O sentido da voz vinha sempre deturpado e o gesto oculto era revelado como parte integrante do dia e da moda.
Que é que me fez parar? Pergunto às vezes o que é que me fez parar. Porque eu sabia tudo. Sabia o resto de todas as histórias e as surpresas tinham ficado todas no passado, na angústia do passado.
Falta-me distância para perceber. Falta-me estar já noutro lado para compreender o erro de não estar aqui. Deve ser este o melhor método para perder sempre.
Aibieme
2 comentários:
Também espero pouco... mas espero sempre!
muito intimista, passa-se aqui cais quer coisa...
cuidado com as distâncias, o que perdes em macro ganhas em micro e vice-versa, mas como não resisto a meter o bedelho aproxima-te queremos ver-te!
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