Gosto de estradas sinuosas; de não chegar nunca ao destino; de ficar pelo caminho e nunca ter de esperar pelo regresso.
Gosto, agora que o digo, e não sei o que diria ausente numa estrada sinuosa sem conseguir chegar ao destino.
Gosto por pensar que é bom gostar de coisas estranhas e querer que a estranheza se instale em qualquer lugar de mim, nem que seja à força.
Gosto de gostar, antes mesmo de pensar no que gosto.
Viro-me para o lado de onde vem o sol e espero que queime, que me dê uma indicação clara do lugar para onde vou e a que distância fica o norte.
Várias vezes me pergunto o que quero dizer deste gosto que tenho em gostar sem saber de quê e o que quero saber quando o sabor de um gosto me perturba o gosto de outro sabor que já não sabe como o sabor de outro gosto de que gostei.
Jogo, por isso, como o gosto e com a maneira de pensar o gosto.
Gosto de lugares onde ainda não fui; muito mais do que dos lugares onde já estive; e ainda mais do que dos lugares onde estou.
Já não é como era quando o que queria era chegar depressa ao lugar de ocaso.
Espero enquanto espero que a chegada se demore no caminho e aguardo o momento, que não ainda o momento final.
Sobre o tempo fica pendente a sua imperfeição; o seu andar levemente descaído para a indiferença; a bússola pousada no colo a pensar horizontes magnéticos de desejo.
Estamos parados agora no vale de lugar nenhum; ligeiramente à esquerda da fonte da sede eterna; próximos do oásis da desidratação; vigiados de perto pelos satélites da absoluta ausência.
Há setas a indicar o horizonte, erguidas sobre plataformas rotativas que giram com a penumbra e sigo com os olhos o risco altivo de um avião que regressa a casa.
Gosto de ficar por aqui pela parte norte do desejo.
Não monto a tenda porque isso já me pareceria uma concessão ao destino.
Fico à espera como se não esperasse, e com o tempo percebo que já não espero e monto novas teorias da existência, repelindo a fé e a intensidade dos sentidos, substituindo o arfar sagrado do cansaço por novas leituras da realidade, erguendo sempre a vista para uma verdade que já não está lá.
Não é forçoso que o mundo seja perfeito; não é forçoso que se mova; não é forçoso que seja como eu o quero às vezes, nessas vezes curtas em que eu o quero.
Gosto do que está antes, do que vem antes de o movimento ser excessivo, antes de a música ficar demasiado alta, antes de a bebida ter tornado os sentidos inoperantes e as cores serem todas uma, antes de ficar desiludido no lugar que procuro.
Sobre a marcha lenta que antecipa a rigorosa chegada à meta, adormeço as tempestades, arrumo os modelos reduzidos da minha intenção e preparo a partida para outra etapa em que os ventos tenham apagado os trilhos e enfeitiçado a paisagem de miragens.
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