Ele bebeu o sangue e voltou a sair, não pela porta por onde entrara, mas por outra que não sei dizer qual devido ao estado de agonia em que fiquei quando ele bebeu o sangue com a mesma passividade de quem bebe um copo de água - ou uma cerveja sem álcool para não parecer tão prosaico.
Na rua chovia. E o que chovia não era sangue. Água, um bocado suja, verdadeira lama por vezes que deixou os carros imundos, mesmo o dele que agora, já sem sede, se sentou no renault quatro gtl e pegou num livro que não era nada um livro normal daqueles que servem para ler ou pelo menos para colocar estética e estrategicamente numa estante, embora, bem vistas as coisas, também pudesse servir para enfeitar uma sala.
O livro, dizia eu, era uma caixa e tinha dentro dela uma pistola de cano curvo, e dento da pistola uma munição e dentro da munição uma potência de morte. Só muito mais tarde soube porque é que o cano da pistola era curvo.
No acto do suicídio a posição do pulso é muito importante. Já se escreveram vários tratados sobre o assunto e todos eles – a maioria, obras de gente experiente – referem o pulso como o elemento chave de todas as histórias que podem acabar mal. Por um lado há o impulso, a lei informal de trazer o destino para o lado menos optimista. E não há outro lado como, por lapso, possa ter parecido.
(continua)
Torcato Matos
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