Capítulo V (versão um ponto zero)
- AAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHH!
- Que é que se passa?
- Dei um grito.
- Que é que aconteceu?
- Nada.
- Então porque gritaste?
- Apeteceu-me.
- Apeteceu-te gritar!?
- Sim, apeteceu-me dar um grito.
- Assim, sem mais nem menos?
- Sim. Um grito espontâneo. Sem razão aparente.
- Assustaste-me.
- Não era minha intenção.
- És um estúpido!
- ...
- Se foi sem razão aparente é porque houve uma razão...
- É uma questão filosófica. Há sempre uma razão. Quero dizer que para todo o efeito há uma causa.
- E qual foi a causa?
- Do grito?
- Claro! De que é que estamos a falar?
- Hum... Uma rápida e intensa expulsão de ar dos pulmões que aproveitam uma posição particular das cordas vocais e a abertura da boca.
- Essa é a causa do grito!?
- De uma maneira muito sucinta é a sua causa directa.
- E o que é que te fez expulsar o ar dos pulmões com essa pressa toda para aproveitar a posição particular das cordas vocais e a abertura da boca?
- Tinha os pulmões cheios de ar que tinha acabado de inspirar. Faço isso muitas vezes.
- Sim, eu também. Mas porquê a pressa?
- Foi o diafragma. Foi. Fez muita pressão e expulsou o ar.
- Compreendo. Serás capaz de me dizer então porque fez o diafragma essa pressão toda, assim de repente?
- Hum... Isso já são pormenores técnicos que me ultrapassam. Acho que o diafragma é um músculo, estás a ver? Comporta-se como qualquer músculo, mas não sei pormenores, digamos que já é uma questão demasiado íntima. Ou especializada. Estou a escrever um texto em que demonstro a íntima relação entre a intimidade e a especialização.
(continua)
Torcato Matos
Sem comentários:
Enviar um comentário