sexta-feira, agosto 11, 2006

Pitrol

Nada disto faz sentido e ainda assim a gente insiste. Diz umas coisas a seguir às outras cheio de vontade de ter razão mas pouco disposto a pensar muito nesse assunto ou noutro qualquer. Deixar discorrer as palavras de maneira abundante. Consentidas mas não sentidas. Quando digo a gente falo de mim que sou o meu agente e o meu objecto de crítica construtiva. O não saber é apenas uma forma como outra qualquer de retardar o avançar da hora a caminho de coisa nenhuma. Esta velocidade louca com que avançamos não é o tipo de velocidade de quem quer chegar a algum lugar. Não. É apenas a velocidade de quem foge mesmo que não saiba de quê. E não sabe de quê. Claro que não sabe de quem. A gente que anda por aí, eu, portanto, passa pelas coisas sem as ver nem as perceber e num certo sentido - que é o mesmo que dizer sem sentido nenhum - é mesmo esse prazer de não saber nem sentir que se procura. Para quê andar a tentar fingir que tal e coisa, que era interessante ir agora ver uma exposição muito engraçada que até falaram no jornal e depois chegar lá e não conseguir perceber nada daquilo e, pior ainda, ter que dar a impressão que se percebe para manter a ilusão das coisas e não criar um brusco solavanco no mundo. E o problema não está na exposição. Está na dificuldade em perceber as coisas. Cada um, eu também, às vezes, acrescenta um digito ao código de maneira a que a coisa se torne o mais obscura possível e não há paciência, é que não há mesmo paciência. Imaginem agora que para ir ver uma exposição e passar uma tarde bem passada cheia de surpresas e reconhecimento eu tinha antes de ler meia dúzia de manuais e mais não sei quantos catálogos e até saber a história da coisa. Não. Perdi o comboio num lugar qualquer e agora já não dá. Já não consigo acompanhar. Já não estou em condições de me preparar para as piscadelas de olho e ficar muito contente por pertencer ao clã. Qualquer que seja o clã. A facção oculta dos iniciados na obra sincrética do ídolo dos anos noventa que pintava os tectos dos subterrâneos dos sarcófagos de Minsk! Não. É claro que não. Ao virar da esquina há sempre outra coisa potencialmente mais interessante para me surpreender. Digo eu que não sei o que há ao virar da esquina nem estou preocupado com surpresas. Se queremos ser surpreendidos, nós, a gente, eu, damos uns gritinhos, meio histéricos, meio emotivos, meio fingidos, meio vamos lá a animar este pessoal, usando técnicas muito giras, e muito verdes, e muito sorridentes. Eu queria dizer parecer surpreendidos mas já nem vale a pena estar com distinções entre coisas que valem o mesmo seja lá onde for. Pois a questão deve ser essa (continuo estupidamente à procura de palavras mais importantes e fundamentais do que outras), o valor. Vale ou não vale e se vale quanto vale. Traduz-me isso em euros, em dólares, em barris de petróleo. Deve ser isso. Chego sempre a qualquer coisa parecida com barris de petróleo mas não vejo como tomar isto como uma fixação da infância. E perco-me. É a tal questão do sentido, ou da falta de sentido. Sei lá do que estou a falar quando falo de barris de petróleo.

Artur Torrado

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