sábado, julho 08, 2006

Segue o cego e vês a vez

Quando o artista fala, deita pela boca fora muitos paradoxos. Ficamos por isso desentendidos mas a comunicação rola sobre a relva enxuta. A bola sobe sempre acima da iluminação dos holofotes e deixa por momentos de se ver. Do Vouga vêm as almas mais pacíficas à procura da morte. Do artista então ninguém fala porque é sempre um homem que domina o verbo. Partir? Para onde iremos agora que as flores do paraíso já murcharam todas com a indecisão do ministro. De Deus, a Quem o respeito é devido, podem sempre ser dadas as melhores referências. Bíblias gráficas, cheias de iluminuras, foram local de aprendizagem para gerações de monges copistas que deram ao tempo novo a sua razão de cor. E salteadores houve que se apropriaram dos tesouros da humanidade e a pouparam de se perder. Com tanto lixo tóxico acumulado que até já se fazem exposições de partes de corpo humano. De Caim, que sempre foi tido como má rês, pode dizer-se que teve a arte de iniciar as trevas ao negar-se à obediência. Cega de inveja veio a virtude mais tarde a esclarecer que a história pode não ter sido escrita dessa maneira linear. Mente quem teima em negar a importância da arte. Factos são factos e quem vai ligar às vis afirmações dos que perdem? A semente que foi lançada há milhares de anos, na noite angustiante dos tempos e dos passatempos televisivos, medra agora sob as formas alongadas do buraco de ozono. E a zona onde as coisas correm mal é sempre a norte do equador. Porque a dor do cavalo cansado – também conhecida como sopa de burro – cai da cela em que esteve preso à vida por instantes. Momentos de fulgor, certamente, desprezados pela rotina e pela junta de freguesia. Da loja mandaram hortaliças e pão centeio para fazer um caldo verde à moda de Paris. Ou dais à luz, tanto faz, porque hoje já não é sinal dos céus a chegada de uma cegonha sem gripe ao seu poste de alta tensão. Alta é também uma maneira fácil de morrer ao sair do hospital quando não há mais entretenimentos que façam correr riscos calculados. Numa folha de Excel, com meia dúzia de comandos, pode fazer-se a contabilidade do mais valioso e do menos. Mal fica quem não tem onde cair morto, embora depois pouco importe. Do estrangeiro vêm sempre novas e esclarecedoras definições sobre o que vale a pena. E o castelo dos Mouros já não fica no deserto da Arábia mas nas areias da praia. Mar por onde escorrem os últimos fios de água de uma secura universal da garganta. Funda-se uma nação para impor um novo ideário à vida e à expressão do prazer. De ler tanta coisa ficamos perdidos do sentido e da direcção em que a história segue. Um olhar que se quer pleno e gregário e orientado para o plano da razão. Pura não será a arte por causa da contaminação dos riscos que sobem de não saber onde termina o quadro comunitário de apoio. Moral da história: a arte é o dom de quem queria seguir à risca o esforço do acaso. Ocaso.


Artur Torrado

1 comentário:

António Gomes disse...

Não sei se deva dar respeito a esse filha da puta.